Memórias de um burgo velho: discursos patrimoniais, referenciais estéticos e a reconstrução da “paisagem histórica” na implementação dos albergues difusos na comuna de Santo Stefano di Sessanio, Itália (1999 – 2009)

Abstract

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, a agitação que descreve os centros urbanos maiores, acentuada por problemas típicos de tráfego e poluição, vem intensificando uma “sensibilidade” pela cultura e paisagens rurais. Diante deste contexto que a Itália, assim como outros países europeus, tem buscado uma série de alternativas pautadas na promoção de localidades menores frente ao glamour que gravita em torno de cidades consagradas no cenário turístico mundial. Um dos exemplos mais notórios do país é o da comuna de Santo Stefano di Sessanio, localizada na região do Abruzzo, que fora um importante núcleo agrícola quando, face à crise de modernização italiana, passa a enfrentar sucessivos episódios de recuo demográfico. Por isso que, associada à conjuntura de se encravar dentro de um parque nacional, a localidade conseguiu manter preservados sua arquitetura e urbanismo que remontam à era medieval, o que tem contribuído a um leque de interesses pela tutela de sua paisagem. Neste sentido que no fim dos anos 1990, momento em que o município contava com pouco menos de 100 habitantes, um jovem empresário ítalo-sueco decide adquirir antigas construções locais e restaurá-las, criando uma rede de albergues difusos. Trata-se de uma proposta de hospedagem não propriamente em um único edifício, mas por entre outros espalhados em um mesmo território, como um bairro ou centro histórico, no intento de produzir uma experiência turística mais imersiva. Para alcançar o escopo de reproduzir fidedignamente utensílios domésticos e elementos de mobiliário urbano que datam especialmente ao fim do século XIX e início do século XX, criando assim uma atmosfera “nostálgica” que caracteriza o lugarejo, foi necessária a mobilização de uma série de memórias, que se materializavam em objetos disponíveis em museus regionais e também em antigas fotografias locais, no esforço de extrair informações que pudessem alimentar o teor alegórico das obras. Deste modo, esta pesquisa se volta à uma análise do processo de implementação dos albergues difusos em Santo Stefano di Sessanio, analisando alguns episódios, ou narrativas, que culminaram no delineamento de sua “paisagem histórica” tal qual se apresenta hoje, na condição estratégica de patrimônio de forte apelo estético, bem como de ferramenta à gestão territorial.

Since the end of World War II, the agitation that describes larger urban centers, accentuated by typical problems such as traffic and pollution, has been intensifying a certain "sensibility" around both rural culture and landscapes. Given this context, some European countries like Italy have seeking multiple alternatives in order to promote their smaller localities as a kind of symbolic counterpoint to the glamor that revolves around cities established in the world tourist scene. By the way, one of the most notorious national examples is the commune of Santo Stefano di Sessanio, which was an important agrarian hub in the past when it begins to experience successive episodes of demographic abandonment. Thanks to this scenario, other than the fact that it is inserted in a mountainous national park, the town has managed to preserve its architecture and urbanism, both dated from medieval and renaissance period. In this sense that in the late 1990s, when the municipality had just under 100 inhabitants, a young businessman decided to buy old local buildings and restore them, creating a network “albergui diffusi”. It is, in fact, a proposal of lodging not properly in a one single building, but by others spread out in the same territory, like a neighborhood or historical center, in the attempt to produce a more immersive tourist experience. To reach the goal of reproducing domestic utensils and elements of urban furniture dating especially at the end of the 19th and beginning of the 20th century, it was necessary to mobilize a series of memories, which were materialized into objects available in regional museums and also in old local photographs, in the effort to extract information that could feed the allegorical content of the works. This was planned in order to compose a "nostalgic" atmosphere that characterizes the village back then. That said, this research turns to an analysis of the process of implementation of the “alberghi diffusi” in Santo Stefano di Sessanio’s old town, grasping some episodes, or narratives, that culminated the delineation of its "historical landscape" as it is presented today, revealing itself in the strategic condition of heritage based on aesthetic appeal, as well as in a tool for territorial management purposes.